quarta-feira, 7 de março de 2012

Os olhos azuis

Era mais um dia comum. Nada naquele dia, desde a hora em que eu acordará, dava indícios de que ele seria diferente dos demais.
Acordei, tomei meu banho na velocidade de costume: lentamente. Não tinha pressa alguma de chegar ao trabalho. Não aquele dia. Estava cansado demais por algum motivo que me foge a memória.
Sai do banheiro ainda molhado e terminei de me secar no conforto do meu quarto. Lá era quente, aconchegante. Peguei as primeiras peças de roupa que vi dentro do guarda roupas, joguei tudo o que queria levar comigo até o trabalho dentro da velha mochila vermelha e sai de casa. Dentes escovados. Fones no ouvido. A musica já tocava e animava, ou tentava pelo menos, animar meu dia.
Mal conseguia imaginar, que naquele dia eu teria uma agradável surpresa. Singela. Sem muita importância para qualquer outra pessoa, mas eu nunca mais esqueceria.
A rotina imperava como soberana que é naquela manha. Ônibus cheio. Gente feia, mau humorada. Metrô abarrotado, sem conforto. Cheguei até metade do caminho sem me surpreender com nada.
Lá estava eu. Parado na estação Sé, sentido o meu trabalho.
Aquele metrô da década de 70 chegou e eu entrei. E foi nesse instante que meu dia mudou.
Eu viajava em pé, como era de costume. E a alguns passo a minha direita, sentado no banco ao lado da janela, estava ele. Não faço ideia de quem era ele até hoje, mas sei que ele chamou a minha atenção.
Lembro como se fosse a algumas horas atras que eu tivesse visto.
Cabelos lisos, negros como a noite. Curtos. Mais curtos dos lados, acima da orelha, e na parte superior da cabeça, uns dois, ou três dedos de cabelo cuidadosamente penteados e modelados com gel para cabelos. Tinha a pele branca. Não consegui reparar com detalhes a pele, pois estava longe e sou míope. Mas consegui detalhar os traços daquele rosto branco. Olhei com cuidado através de meus óculos, não queria perder nada.
Tinha um traço sério delineando seu rosto. A forma do seu rosto era levemente pontuda. Dava para ver os ossos de seu maxilar. Seu nariz era levemente grande. Pelos traços, tinha eu seu sangue o DNA europeu. Diria eu que devia ser Italiano.
Tinha uma postura ereta. Seus ombros eram largos e visivelmente marcados pela camisa social branca que vestia. O mesmo vale para os braços. Não era musculosos, mas pareciam fortes. Sua camisa estava com os dois primeiros botões abertos, o que dava acesso a parte do peitoral. Nada muito extravagante também.
Era um rapaz bonito, isso não se pode negar. Charmoso. Certamente, fazia sucesso por onde passava. Mas nada de todo esse charme foi o que de fato me chamou a atenção. Seus olhos azuis, que tinham como contorno superior, uma grossa sobrancelha foram o algo da minha atenção.
Sempre me atentei ao olhar das pessoas. Olhos e sorrisos. Sempre.
Ele olhava para a janela. Perdido. Parecia buscar alguma coisa que ele sequer sabia por onde começar. Parecia buscar o remédio para algo que estava machucando ele demais.
Completamente absorto dentro dele mesmo, ele olhava para a janela que do lado oposto só mostrava o túnel correndo lá fora.
Comecei a me questionar o que se passava ali, naquela cabeça. O que fazia aquele homem bonito ficar olhando tão perdido para o lado de fora. Nesse instante, sem perceber, ele se virou e nossos olhos se encontraram pela primeira vez. E numa fração de segundos eu me vi fora daquele vagão.
Fui parar num lugar desconhecido, talvez o lugar onde aquele rapaz estivesse perdido. Mas logo depois voltei.
Continuei minha observação e vi ele olhando novamente perdido pela janela e pensei que se o problema dele seria algum amor... Alguma coisa que tenha lhe ferido o coração. Talvez fosse.
Já tive momentos assim onde eu olhava de forma semelhante para o nada e pensava no motivo de tudo dar errado. Ele parecia mesmo, muito triste. Perdido.
Mas porque uma pessoa tão bonita sofreria por amor? Ele vendia charme, podia ter quem ele quisesse. Mas e quem ele queria, queria ele?
Comecei a filosofar e fui longe. Cogitei diversas hipóteses. Problemas financeiros. A morte de algum parente. Um problema sério no trabalho. Qualquer coisa...
Mas nada adiantava. Nunca saberia o que de fato afligia aquele homem. Nunca saberia o porque daqueles olhos azuis como o céu de uma manhã ensolarada, estarem apagados como a noite. Derrotados. Eram profundos. Iam longe e voltavam carregados de nada.
Infelizmente nunca saberei nada sobre ele, mas nunca esquecerei aqueles olhos azuis.

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

O menino que sorriu

Chegou de repente em uma noite de um verão qualquer. 
Não lembro quando. Não lembro onde.
Nome algum passa pela minha cabeça. Idade então, não memorizei. 
Um jeitinho simplório. Nem seus trejeitos, nem suas roupas chamavam a atenção. 
Descrição parecia andar de mãos dadas com ele. Seu andar por sinal era único. 
Um jeito menino... Meio malandro... Jeito moleque.
Camuflado no meio de tudo e todos. Não parecia o homem que era. 
Parecia mesmo um menino. 
Talvez, por conta daquele menino que carregava dentro de si.
Um menino que brilhava forte em seus olhos. 
Mas nada disso me cativou de verdade. 
Aquele menino, na inocência de seu ser,  me cativou de outra forma.
Aquela boca cheia de dentes. 
Popularmente conhecido como sorriso. Ah... Aquele sorriso...
Visto por qualquer pessoa sem um misero esforço. 
A dimensão dele seguia de uma orelha a outra.
Não deixava a desejar em brilho, e a simpatia transbordava por ele. 
Cativante, sem dúvida.
Não consegui pensar em mais nada o resto da noite.
Fiquei hipnotizado, confesso.
Maldito fraco que tenho por sorrisos.
Não fosse por isso, talvez eu conseguisse esquece-lo.
Talvez conseguisse dormir as noites que se seguiram. 

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Desabafo indireto de um jogador.


Sorte ou azar? Destino? Estratégia? 

Um dia cheguei apostar algumas de minhas fichas em você. Não foram todas. Sou um jogador. Não me arrisco por completo em jogo nenhum. O risco de perder era grande e eu sabia. Sempre soube. Louco seria se apostasse tudo o que tinha em você. Para minha sorte, não estava enganado. Fui prudente.  Perdi as fichas que apostei. 

Vi e ainda vejo coisas em ti, que ainda me fariam apostar novamente. Mas você e eu somos participantes de jogos diferentes. A vida brinca comigo e com você de formas que só ela entende. Talvez por ser ela que dá as cartas nessa mesa, que você e eu hoje seguimos rotas distintas. Distintas, mas paralelas. 

Eu diria que prefiro assim. Você lá, e eu cá. Mas seria um mau perdedor se o fizesse. Queria-te aqui. Dando as cartas junto comigo. 

Vejo que o tabuleiro da vida é enorme. A cada quadradinho avançado, uma nova descoberta e uma nova aposta foi feita. Os dados do destino foram lançados e nossas rotas se cruzaram. Mas é o jogo da vida. E nesse jogo, nem você, nem eu, temos controle. A sorte aqui, é mera coadjuvante.

As conquistas nesse jogo vão além de cartinhas para trocas, ou de moedinhas cumulativas. 
A vida esfregou na minha cara, que conquistas vão além de coisas palpáveis. 

E nesse jogo de perde e ganha, eu me considero um vencedor. Mesmo tendo saído sem o maior prêmio. Você. Saí com bagagem para a vida. Experiência para o próximo jogo. 

Sem dúvida, quando a vida me convidar novamente para jogar o ardiloso jogo da paixão, eu estarei dois passos a frente do que estava quando comecei a jogar com você. Minha estratégia será diferente. E quem sabe assim, finalmente, eu saia vitorioso e com o prêmio máximo. Um amor. 

Será que nesse jogo cheio de altos e baixos, cheio de adrenalina e de lições para a vida toda, outras coisas valem mais que as experiências adquiridas? 
Essa é uma pergunta que acho que só poderei responder na próxima partida. 

Na roleta russa que você e eu nos enfiamos, não havia uma bala, mas duas. Uma para mim, e uma para você. Eu ganhei a minha e sai do jogo. E você, ainda fica brincando de rodar o tamborete e atirar as cegas?